
Quando uma decisão interna da Igreja encosta na rotina digital de milhares de fiéis, o assunto sai do âmbito paroquial e vira debate público.
Foi o que aconteceu nesta terça-feira (16), depois que a Arquidiocese de São Paulo determinou que o padre Júlio Lancelotti interrompa as transmissões de missas e pare de atuar nas redes sociais.
A ordem partiu do cardeal arcebispo de São Paulo, dom Odilo Pedro Scherer, que conduz a arquidiocese desde 2007.
Na prática, o padre Júlio — pároco da igreja São Miguel Arcanjo, no bairro da Mooca (Zona Leste) — deve suspender tanto as lives das celebrações, que vinham sendo feitas no YouTube aos domingos, quanto a produção de conteúdo nas plataformas onde acumulou grande alcance.

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Ao longo dos últimos anos, Lancelotti se consolidou como um dos nomes mais conhecidos do catolicismo brasileiro fora do circuito estritamente religioso, sobretudo pelo trabalho com pessoas em situação de rua e em extrema vulnerabilidade.
Nas redes, suas publicações giravam em torno de acolhimento, denúncias de violações e defesa de direitos, o que ampliou o público para além da comunidade da paróquia e frequentemente gerou repercussão política.
Com a decisão, dom Odilo voltou ao centro das conversas — e não só entre católicos. Muita gente passou a querer entender quem é o cardeal que comanda a maior arquidiocese do país e como ele costuma se posicionar quando temas sociais e disputas públicas atravessam a Igreja.

Dom Odilo Pedro Scherer é gaúcho, tem formação acadêmica em Teologia e realizou estudos em Roma, construindo uma imagem que mistura perfil de gestor e de professor: alguém que costuma falar com cuidado, sem subir o tom, e que valoriza a ideia de diálogo em declarações públicas.
Dentro da Igreja, ele é visto como um nome influente na América Latina, justamente por estar à frente de São Paulo — uma diocese com peso religioso, social e institucional.
Administrar a Arquidiocese de São Paulo significa lidar diariamente com contrastes difíceis de conciliar: desigualdade social explícita, pluralidade religiosa, tensões culturais aceleradas e uma cidade que muda de ritmo o tempo todo.
Nesse contexto, dom Odilo costuma enfatizar solidariedade, justiça social e a responsabilidade cristã com quem está à margem, ao mesmo tempo em que tenta manter unidade interna num território enorme e diverso.
Além do cargo de arcebispo, Scherer é cardeal — título recebido por nomeação do papa Bento XVI.
Essa condição o coloca em uma camada de maior visibilidade internacional: cardeais participam de momentos centrais da vida institucional da Igreja, como conclaves no Vaticano, e circulam por agendas que vão de grandes celebrações a encontros decisivos da hierarquia.
Mesmo com essa projeção, ele mantém rotina pastoral típica de quem governa uma arquidiocese: visitas a paróquias, reuniões com lideranças religiosas e incentivo à participação de leigos e comunidades locais.
É uma atuação menos “de palco” e mais de articulação interna, com decisões que nem sempre aparecem no noticiário — até que uma delas explode nas redes, como agora.
Quando o tema entra no campo político, da pobreza ou de direitos humanos, dom Odilo tende a adotar um discurso direto: defende democracia e instituições e repete que a Igreja não deve funcionar como braço de partido.
Ao mesmo tempo, sustenta que a defesa da dignidade humana e o combate a formas de exclusão fazem parte do dever moral da instituição.
Dentro da estrutura católica, as duas funções que ele acumula ajudam a entender seu peso: como arcebispo, ele é a autoridade máxima da Arquidiocese de São Paulo; como cardeal, integra o grupo que aconselha o pontífice e compõe o colégio responsável por escolher um novo papa.
No tratamento protocolar, cardeais são chamados de “eminência”, sinal de um cargo com forte dimensão simbólica e poder administrativo real.
A própria experiência de dom Odilo nas redes já trouxe dor de cabeça. Em outubro de 2022, ele publicou no Twitter uma reflexão sobre como eleições e brigas políticas podem romper relações entre amigos e familiares, perguntando se valia colocar valores como justiça, fraternidade, amizade e família “em risco” por causa de disputas eleitorais.
A postagem desencadeou ataques: ele foi chamado de “comunista”, acusado de apoiar o aborto e teve o nome associado ao presidente Lula (PT), além de ser alvo de insinuações sobre ligação com o que críticos rotularam como “ditadura da esquerda”.
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